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Seguindo uma tradição familiar, iniciei minha carreira no magistério em 1977, contratada como professora municipal em Santa Maria. Minha pequena escola, como muitas outras, carecia de todos os recursos materiais.
A complementação da merenda escolar, o gás da cozinha, pequenos reparos, o material para a secretaria e para os alunos carentes, até mesmo o próprio giz, tudo era adquirido através de frequentes promoções como festas, risotos, venda de votos da "rainha da escola", rifas e doações. Nossa função educativa se confundia com o atendimento assistencial. Achávamos isso natural, pois sequer conhecíamos outra realidade. Éramos consideradas as "professorinhas" que, em outubro, eram lembradas e homenageadas, especialmente pela "função maternal" exercida na sala de aula.
Em 1979, iniciou-se uma grande mudança nessa imagem, não somente entre a população, mas também dentro da própria classe. Foi quando ocorreu a primeira greve dos professores gaúchos e a nomeação de novos concursados foi uma das suas conquistas. Assim passei a integrar o quadro do magistério estadual.
Na greve de 1985, eu e meu marido, também professor, participamos das assembleias no Gigantinho, das caminhadas até o Palácio Piratini e do acampamento na Praça da Matriz. Ouvimos o badalar da sineta, cantamos o hino da greve e sentimos o peso da repressão da Brigada Militar. Mas, principalmente, vimos nascer uma nova consciência profissional, que levou à consolidação de importantes conquistas na educação, incluídas na Constituição Federal de 1988.
Relembro esses fatos para demonstrar que a classe do magistério sempre lutou para sobreviver, mas jamais imaginei que seu grande desafio chegaria ao ponto de buscar o direito de manter sua própria vida, a de seus alunos e da comunidade escolar.
As duras medidas tomadas pelo governo gaúcho no isolamento social são absolutamente justificáveis, mas é incompreensível que não tenha se estendido para todo o magistério. Em Porto Alegre foi necessária a intervenção judicial para que as alfabetizadoras fossem preservadas. Em decisão liminar, o magistrado referiu que o retorno presencial no pior cenário da Pandemia de Covid-19, viola frontalmente os direitos à saúde, à vida e à dignidade humana. O TJRS manteve a liminar, sendo que o relator referiu sobre a postura incoerente e pouco razoável do Município de Porto Alegre ao recorrer da decisão.
Não é momento de debates acadêmicos a respeito do retorno ou não às aulas. Sabe-se de todos os argumentos a favor da saúde mental e da importância da escola em todos os sentidos. Mas o que vivemos agora não é normal. Pelo contrário. Nem a geração dos pais ou dos avós dessas crianças viveu período tão crítico. A exposição da comunidade escolar como um todo não pode ocorrer. Nada justifica a incoerência nesse sentido.
Professores, a luta continua. A pauta agora é a vacinação. Que ela venha e que os governantes se conscientizem de que a educação é prioridade sim, mas ela só tem sentido se houver vida.